ALQUIMIA IV
14/09/2017
Um anjo solitário e virgem flutuava nas arenas impenetráveis
da noite como sombra e luz, porém se feriu pelo dilúvio das sensações vivas ali
presente. A primeira coisa a ser notada foi
uma lei que aprendera há muito, uma certa irresistibilidade diante do
homem. Algo inteiramente novo para ele.
Mas o que lhe chamou mesmo a atenção foi a paixão humana e seus efeitos avassaladores. Então, ele
constituído de uma matéria silente, invulnerável e eterna se fez atuar sobre a criatura carnal e
dualista para auxiliá-lo.
Sua voz como o
canto de um pássaro raro e passageiro logo mergulhou no sono e na passividade de
uma lembrança tênue. Não funcionou.
As
sombras pardacentas daquela personalidade humana, como um muro intransponível,
resistiram-lhe. Uma escuridão maior do que a da noite sobrepôs qualquer ação angelical.
Mesmo assim, em quase todas as direções se travou uma batalha descontínua e intolerável, por um tempo que o ser etéreo chamou de agora e o homem de uma vida.
Quando a
alma já desabrochada e movida por uma nova e maior consciência, já tendo circundando o abismo incandescente das tribulações,
questionou:
"Tu me ajudaste, anjo?"
Este respondeu:
"Não consegui. Contudo, testemunhei algo importante: o extraordinário que há em ti o cozinhou no fogo de tuas próprias paixões até que os vapores ebúrneos do bom senso aparecessem."
Carlos França