Leitor, O Mestre do Impossível
Falamos dessa criatura diferente
e igual ao valor da aventura, um leitor. Vive percorrendo mundos,
percorrendo-se. Sai por aí em desafios, próximo aos olhos e, no olhar
percorrido, signos amados que saltam como imaginação prodigiosa. Como se nascido no abrigo de mundos imaginários e por eles abençoados. E assim se descobrem pertencidos.
Entra e é
capturado pela narrativa. Preso, amarrado, amando tudo, vivendo histórias, lugares e épocas. Mas de repente, vira um náufrago
do livro. E aquela experiência pode mudar sua vida inteira. O leitor sem
compreender o tamanho do seu próprio mundo, constrói em seu coração o palco
para o espetáculo da tinta. É um desbravador da música do silêncio no seu pequeno
templo, ali debruçado sobre as mãos.
Já o tempo é a sua casa e sua maravilha na
chama da existência que o respeita e o respira em fôlegos de palavras. Este
solitário aventureiro, atreve-se vivendo
mil vidas, parindo-se primeiro em ato gentil do servir, como um vassalo das letras, no reino das palavras pela divindade das ideias.
Porém, é um rei conquistador, mas só no depois do si mesmo da narrativa, ao ser
expulso de cada página que avança, de
cada capítulo que alcança ou de cada final que chega, pois sabe que seu destino é expandir suas
fronteiras por toda vida.
De outro lado, parece sempre inocente, não do fim da narrativa,
da história ou de seus personagens. Mas do próprio fim. E chega a vários. Inconsolado
em quase todos, ainda que o livro nada ofereça nesse sentido. Sem se dar conta,
descobre a mais perfeita alquimia em letras
vivas de sentidos ao transformar mundos internos. A vida se autoriza em outras realidades que só um coração
feito de asas pode favorecer e uma mente que é visitante de tudo pode estabelecer.
Quase um físico quântico na excentricidade da poesia e no concreto das ideias
que multiplica universos e possibilidades. E caminhando na estrada de outros,
outros todos, outros tudo encontra a si em saberes, em sentires, em amores, em
vontades até espelhar territórios vastos do ser. Simplesmente abre horizontes inéditos para o encantamento da vida, da própria vida, quando não, distribuindo
forças a tantos, enchendo a estrada da presença da arte do a mais da vida.
E
assim, não é incomum, o leitor sempre qdesejar mais livros
e mais livros. A tal ponto, que Mais é pouco. Mais é palavra alguma. Livros e
infinito tornam-se um caso escandaloso de sinônimos compulsórios. O rio não é mais o mesmo, o leitor mesmo, muito menos, porém um
livro pode ser sempre novo e outro, ainda que já lido, num total e maravilhoso reencontro.
No final, o
leitor é a prova da metafísica da experiência
no sutil, em ser o que se é, humano, no caminho da vastidão e da riqueza. Ou talvez, num sentido mais poético, um apaixonado de almas em histórias
rabiscadas, cujo o sangue é a tinta, o corpo o texto e o universo o livro. E de cuja onipresença ele se enamora frivolamente, mas levando a sério só a metade do que sente. A outra é incomunicável.
E quando perguntado o que são na prática os
livros? O leitor diz, "o livro é um mestre da vida".
Carlos França
no dia do leitor 07 01 2020